Descobri que estava grávida, no dia 9 de Maio de 2006. Após alguns dias de indecisão, deixámos a alegria invadir-nos.
Após a amniocentese e uma semana chaaaaata, sem me mexer, soubemos o resultado era um menino, perfeito e saudável, confirmado mais tarde em cada eco e no CTG.
Não sei bem porquê, uma vez que os outros dois partos não tinham sido provocados, desde cedo que ficou combinado induzir o parto às 38 semanas, dia 21 de Dezembro de 2006.
Assim, no dia programado, lá fomos. O dia não começou muito bem, era um dia cinzento e chuvoso, os meus filhos, como sempre, fizeram a cena do costume para sair de casa, de tal forma que cheguei a gritar com eles e a "passar-me". Lá os deixei no Centro de Apoio Pedagógico - Planeta do Conhecimento e despedi-me da minha colega, sócia e amiga, que me deu tantos beijos e me abraçou com tanta força que me assustou (mais tarde contou-me que tinha tido um mau pressentimento, que o Afonso não estava preparado para nascer, que desde que a mãe morreu, ela tinha 4 meses, que isto lhe acontecia. Curiosamente, foi a primeira amiga a virar-me as costas, quando percebeu que o Afonso não ia ficar bem, conseguindo mesmo acabar com o nosso projecto, que tanto trabalho nos tinha dado a construir e tanto prazer nos dava, deixando-me de repente sem qualquer tipo de remuneração).
Estava muito calma, afinal tudo estava planeado.
Quando chegámos ao hospital e após o exame normal, a médica disse-me que o bebé ainda estava muito subido, nessa altura disse-lhe que não tinha vontade nenhuma de passar pelas dores e pedi-lhe para me fazer cesariana e a laqueação. Respondeu-me que íamos tentar, porque era melhor para mim.
Eram 10h30 da manhã, quando me colocaram numa cama, com soro (a agulha foi mal colocada e passado 15 minutos já tinha a mão toda inchada e uma nova picadela na mão), ligada ao CTG (que controlava os batimentos cardíacos do bebé) e colocaram o "tal" comprimido para induzir o parto. O tempo passava e nada. Às 14h30, a situação mantinha-se dilatação zero. Colocaram novo comprimido (metade) e continuámos a aguardar. Às 17h30, continuava sem dores, pedi novamente para me fazerem a cesariana (disse "se fosses minha amiga fazias cesariana") ela perguntou-me se queria fazer a laqueação e saiu para tratar de tudo. Quando voltou, talvez meia hora mais tarde, fez-me o toque, nessa altura, o útero já estava permeável e com as mãos rebentou a bolsa de liquido amniótico. As enfermeiras parteiras (duas) que me acompanharam colocaram o soro com ocitoxina e o PESADELO COMEÇOU.
Eu tinha orgulho, tinha tido 2 filhos de parto normal, com contracções dolorosa e nunca tinha dito um "ai". De repente as maiores dores do mundo (as físicas, porque as emocionais ainda estavam para vir), chegaram, o meu marido tentava acalmar-me mas, as dores eram insuportáveis (nem sei explicar, ainda sinto dor agora que escrevo) e pararam de imediato o soro e chamaram a anestesista. A aflição era tão grande, que fiquei com dificuldades em respirar e colocaram-me oxigénio. Não sei como consegui manter-me sentada e sem gritar o tempo suficiente para me darem a anestesia (epidural). As dores começaram a passar mas, a enfermeira A. (a tal stressada do post anterior), disse à doutora se não era melhor manter o oxigénio. A médica disse que não era necessário, que eu estava bem mas, ela insistiu e disse "para o bebé, doutora", a médica concordou e fiquei com oxigénio. As dores pararam e o batimento cardíaco do Afonso baixou, primeiro para os 120 e depois para os 100... de repente (não sei se há aqui algum lapso de tempo), ela estava a pedir para eu me levantar e a levar-me para a sala de partos, pelo caminho encontrámos a médica, que disse"Já! Ia agora comer um iogurte". A sala de partos estava às escuras, e de repente super povoada, 3 médicos obstretas, 2 enfermeiras parteiras, 1 pediatra e uma enfermeira de pediatria. O ambiente era calmo e bem disposto e o meu marido foi autorizado, pela primeira vez, a assistir ao nascimento do filho. Nesta altura, no auge da epidural, não tinha dores e fazia força quando me mandavam. Colocaram um forcep (penso que para ajudar) e lá me incentivavam a fazer força, de repente, talvez 10 minutos depois, o PÂNICO. Uma ventosa, mais um forcep, respira..., respira..., para o bebé (dizia a tal enfermeira stressada) e conseguiram tirar o Afonso.
MORTO, SEM CHORAR, SEM RESPIRAR...
De repente o silêncio, o silêncio no meu coração, disse ao meu marido "não quero que ele sobreviva", o silêncio pesado era interrompido pelo tocar insistente do telemóvel do pediatra, que tentava desesperadamente, reanimá-lo o toque era O RISO ALEGRE DE UM BEBÉ...
Levaram o Afonso, passado algum tempo, não faço ideia quanto, a minha alma já me tinha abandonado.... o pediatra veio dizer-nos que o Afonsinho conseguia respirar sozinho mas, por prevenção estava ventilado e ia ser transferido para o Hospital São Francisco Xavier. Perguntei-lhe se ia ficar com sequelas, respondeu-me que naquela altura era muito cedo para saber.
Ok e foi hora de desligar...
Na sala de partos continuavam os procedimentos, retirar a placenta, cozer, e o sangue não parava. Mais um ponto aqui, agora ali, em x, em v, em y e a hemorragia continuava. Nesta altura já era o médico, Dr. F. (que fez o parto do G.) que me acompanhava. Pedi para me colocarem num quarto sozinha, sem mães ou bebés. Enquanto o meu marido foi ver o Afonsinho, eu não o cheguei a conhecer, fiquei no corredor ao lado da sala de partos à espera de ser levada para o quarto. De cada vez que me mexia, sentia o sangue a correr.
O medo, e o que dizer, afinal já eram 10 horas da noite e os nossos filhos, a família e os amigos, estranhavam a ausência de (boas) noticias. Os médicos convenceram o F. vir a casa, estar com os miúdos e comer qualquer coisa. Eu sei que combinamos qualquer coisa para dizer mas, sinceramente não me consigo lembrar.
As hemorragias continuavam e voltei novamente para a sala de partos. Descoseram e voltaram a coser. Nesta altura a anestesia já se tinha ido embora, o médico a cada ponto, pedia desculpa ("eu sei que estou a magoar, querida") mas, naquela altura mais anestesia era impensável e eu, sinceramente, JÁ NÃO SENTIA NADA....
Lá voltei novamente, para o corredor. O corredor ficava no meio de várias salas, penso que eram como os médicos se sentiam, sem saber para onde me levar, o corredor dava para qualquer opção. Entretanto fizeram uma eco para ver se havia algum resto de placenta mas, estava tudo bem. As hemorragias continuavam e de repente comecei a vomitar, a sentir-me tonta, a ir... A tensão baixou drasticamente, avisei as enfermeiras, não me lembro dos valores mas, as análises chegaram e pediram plasmas. Quando a tensão chegou a valores perigosos (5 /2) comecei a perceber o pânico dos médicos. De repente os médicos de cirurgia estavam ao pé de mim e fui transportada para o recobro do bloco operatório. E lá fiquei, 2 dias, penso eu. Após algumas transfusões de sangue (9) comecei a melhorar e fui transferida para a maternidade para o tal quarto sozinha. Nessa altura, diz quem me viu, já tinha recuperado um bocadinho a cor, e não estava tão inchada (disseram-me que parecia um monstro, sem feições), o meu marido que sempre me ajudou a colocar pomada na zona da costura, ficou horrorizado quando viu.
Mais tarde disseram-me que tinha tido um colapso do útero. Alguém, disse-me que me tinham rasgado o útero com os forceps. Quem sabe...
Mas eu recuperei totalmente e o Afonsinho já sabem é mais uma das luzes dos meus olhos, agora, graças a Deus tenho 3. E não os trocava por nada deste mundo....
1 comentário:
Olá "d"
Não tenho palavras para este teu relato.
Infelizmente nem tudo na nossa vida é controlável ou programado. Por vezes Deus prega-nos rasteiras na vida, o porquê, isso não sei te responder, nem ninguém o saberá, mas tudo na vida tem um sentido e é nesse lema que eu acredito. É daí que retiro todas as minhas forças para continuar a lutar e para nunca baixar os braços.
O meu caso foi muito diferente do teu (um dia teremos oportunidade concerteza para o te contar), e quando no dia 18 entrei no Hospital, nunca imaginei o que viria a seguir, nem sequer coloquei a hipótese de algo correr mal....infelizmente correu, mas isso foi passado e agora olho para ele com outros olhos.
"Deus escreve direito por linhas tortas", mais um ditado de sabedoria popular que tem muito que se lhe diga, mas eu continuo a acreditar, espero que tu também consigas fazer o mesmo.
Um grande beijinho
Cláudia e crianças
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