Por todos os motivos e por motivo nenhum, hoje decidi escrever sobre o que é viver neste mundo paralelo à vida em normalidade.
Posso começar por aqui, o que é a normalidade, perguntam muitos, especialmente, nós que vivemos (também) neste mundo paralelo mas, a verdade é que existe uma normalidade.
A vida normal, é termos uma gravidez normal, um parto normal, um bebé saudável, que vai crescer, vai para o jardim de infância, para a escola, faz natação, joga à bola, pratica ballet, aprende guitarra..
Ter um filho com dificuldades e naturalmente com necessidades especiais, não é normal.
Não é normal e não é especialmente fácil...
A dor, a tristeza que nos invade, a pena que temos de nós próprias, dos outros filhos, os problemas familiares, normalmente com o marido que muitas vezes, não quer encarar a situação, que não nos apoia, os amigos que afinal não são amigos...
A nossa vida torna-se miserável, difícil, tudo muda e nós queremos acreditar que o nosso caso vai ser o "milagre", afinal eles existem, a excepção, que confirma a regra...
Eu passei por tudo isto, tudo não, porque o meu marido sempre foi e é um pai e um marido excepcional...
Chorei durante noites inteiras, não dormi noites e noites, desesperei-me, tive vontade de desaparecer, de fazer os dias andarem para trás, não ter tomado a decisão de ter o Afonso naquele dia, enfim...
A verdade é que apesar de todo este desespero, nunca desisti, apesar das enormes dificuldade com que me fui deparando dia a dia, nunca desisti...
Desde cedo o Afonsinho foi acompanhado na terapia da fala e na fisioterapia e conforme os meses foram passando e a idade foi permitindo fomos iniciando as outras terapias. Em casa nunca descurei o trabalho quer físico, quer cognitivo.
Investiguei, li, perguntei, inventei, fui fazendo experiências, sempre acreditei (e continuo a acreditar) que sem tentar nunca saberemos.
Adaptei a casa para lhe proporcionar locais de conforto mas, também de estimulação e trabalho.
Construi materiais de apoios (cartões,talas,tapetes...) adquiri jogos, brinquedos que o estimulassem, livros, livros e mais livros...
Procurei os melhores médicos, as melhores terapias e os melhores terapeutas.
Procurei fazer novos amigos, que vivessem a mesma realidade.e tive a felicidade de os encontrar.
Amigos que me aconselhassem, que me encaminhassem, me ouvissem, com quem pudesse partilhar as dores, os desânimos, as inseguranças, os medos e receios mas também as alegria, as vitórias, os progressos...
Criei o blogue, como já muitas vezes escrevi, como terapia, de mim para mim mas, este fenónemo da blogosfera, trouxe-me muitas histórias de vida, tão iguais e tão diferentes da minha...
Aqui encontrei pessoas puras, verdadeiras que tal como eu amam incondicionalmente os seus filhos e lutam, muito, pela sua reabilitação.
Pessoas que aprenderam a aceitar (ou a ir aceitando) as suas dificuldades, as suas diferenças, fazendo em cada momento o melhor pelo seu bem estar, pela sua autonomia, pela sua felicidade, mesmo não sendo o que sonharam, o que desejaram, mesmo que nunca tenham pensado em fazê-lo, porque têm uma imensa capacidade de amar os seus filhos e uma enorme capacidade de valorizar cada momento, cada passinho, cada sorriso, cada vitória...
Pessoas que aprenderam a serem (ainda mais) felizes, porque deixarem de pensar nelas, na sua vidinha anterior (por mais atractiva que fosse), para se dedicarem a um bem maior, os seus filhos...
Não há maior felicidade do que a dádiva de amar os outros, de aceitar cada um como é, sem discriminação, sem diferença, com o coração, um coração generoso, desejoso de ajudar, de partilhar...
Se continuarmos a olhar para os nossos filhos, à espera do milagre, à espera da excepção, não somos nós os primeiros a discriminá-los? A olhá-lhos com diferença?