Que ele saiba que, invariavelmente, pode contar comigo, nos tempos de celebração e na travessia das longas noites escuras.
É dele também a minha mão. É dele também o meu abraço. É dele também a minha escuta. É dele também o meu olhar amoroso. É dele também os meus melhores sorrisos.
Que se saiba amado muito além do de vez em quando, do por causa de, do se.
Que se sinta amado como é, não interessa com que cara a circunstância esteja. Que se sinta amado simplesmente porque é...

Ana Jácomo
Não me peça para esquecer as cores, meu coração sempre andará com as lembranças felizes.
Tendo na visão do futuro, as flores, o voo dos pássaros, um lindo céu azul com nuvens desenhando belas formas...
E talvez um mar para banhar e salgar as manhãs.
Não me peça para esquecer a imensa beleza da vida.
Apesar de tudo o que já passei, de tantos dissabores, há sempre algo que movimenta a nossa esperança...
Uma criança que nasce para ser amada e ser feliz, uma flor que desabrocha para ser contemplada por quem quiser, um menino que cresce e segue um caminho repleto de luz...

Carol Timm

Afonso

O caminho começou no dia 21 de Dezembro de 2006, o Afonso nasceu em morte aparente, ficando com lesões cerebrais, que lhe causaram paralisia cerebral. Atravessámos longos dias de hospital, dias em que a dor e a preocupação não nos abandonavam mas, desde cedo, percebemos que era um lutador e todos os dias lutamos, com ele, para chegar onde lhe for possível e quem sabe… afinal é um caminho que se faz caminhando...

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Epilepsia

Por volta dos 3 meses o Afonso começou a ter pequenos espasmos musculares. Inicialmente na cabeça, depois nos braços. Estes espasmos foram associados a pequenos sustos devido à imaturidade cerebral.
Em Junho, teve uma crise que durou cerca de 20 minutos, em que estes espasmos percorriam todo o corpo com maior incidência do lado esquerdo. Fizemos um electroencefalograma em Julho que não acusou nada. Entretanto os espasmos (mioclonias) foram aumentando.
No dia 1 de Outubro de 2007, o Afonso teve uma forte crise, durante cerca de 1 hora, o seu corpo foi submetido a violentas crises (convulsões?) mas, sem nunca perder a consciência.
Foi medicado com Diplexil (um anti-convulsionante) e durante 6 meses as crises mantiveram-se começando a decrescer gradualmente, mas de forma muito lenta. Houve períodos em que chegou a ter cerca de 80 crises por dia.
Desde o inicio de Abril que o Afonso deixou de ter crises.

Zangada com o mundo...

A partir de Fevereiro, com grande tristeza, o Afonso passou a ser acompanhado por outra fisioterapeuta.
Funcionárias públicas, das 8h00 às 16h00, nem mais um minuto, pontes, férias no Carnaval e na Páscoa. Só assim já soa mal mas, não podemos esquecer que estas duas senhoras, ditas terapeutas, trabalham num centro de reabilitação para CRIANÇAS com paralisia cerebral.
Deixo aqui duas situações, infelizmente, foram muitas mais, só para não me esquecer nunca, como o Afonso está agora bem acompanhado.
Em Janeiro na consulta de avaliação com a Fisiatra, médica, que infelizmente também pertence ao grupo dos maus profissionais, ouvi-mos eu e o pai, a seguinte conversa por parte da senhora terapeuta da fala. -" O Afonso é um TIRANO, manipula a família, a irmã está sempre a chorar por causa dele, o irmão anda fechado, não fala com ninguém"
  • O Afonso é um bebé, com necessidades especiais, com 12 meses na altura
  • O Afonso tinha e ainda hoje, tem dificuldades em estar sentado na cadeira do carro e chora muito, o que naturalmente incomoda a C., o G. , o pai, o avô, a mim, enfim qualquer pessoa.
  • Nas férias do Natal disse à fisioterapeuta, e a senhora terapeuta da fala ouviu, que naquele dia ia a C. e no dia seguinte o G. para ver como era o Centro, pois ele, tinha algum receio do que ia encontrar.
Foi essa e muitas mais vezes e continua a ir à Liga onde há situações verdadeiramente complicadas.
Os meus filhos aceitam o Afonso, acompanham-no para todas as terapias. São crianças inteligentes e preparadas para o futuro, o deles e o do irmão.
No caso da senhora fisioterapeuta, mandou ligar-me a dizer o seguinte: "A senhora terapeuta diz para a mãe não trazer, o Afonso hoje, porque NÃO TEM TEMPO para ver o Afonso".
Esta mensagem, foi deixada às 10h00 quando a sessão começava às 11h30. Liguei-lhe e confirmou-me, que naquele dia, tinha que acompanhar dois meninos nas consultas. Estranho? Para quem me avisou com TRÊS SEMANAS de antecedência que ia a uma consulta com o filho. Quando lhe disse que não era atitude correcta disse-me "D. você está zangada com o Mundo".
Por acaso não estou, e se estivesse, seria assim tão estranho?
Em boa hora, nos viemos, embora

Uma nova etapa - Terapia da fala

Que desilusão!!!
No Centro de Paralisia Cerebral, uma vez por semana, o Afonso tinha terapia da fala, sessão onde lhe era dada alimentação (treino alimentar). A senhora terapeuta, decidiu, desde o 1º dia, tomar as rédeas da situação e ignorar quem mais sabia sobre o Afonso, Eu.
Assim, eram 45 minutos em que o Afonso chorava, gritava, cuspia, fazia hiper-extensão (padrão da sua patologia) e nunca, durante os 6 meses que lá estivemos a senhora terapeuta lhe conseguiu dar uma refeição.
Logo após a 1ª sessão e em outras ocasiões falei com a assistente social da equipa, (irei falar sobre ela mas, não neste texto, onde ela não merece estar) mas não conseguimos alterar nada.
Em boa hora, nos viemos embora!

Avaliação

No dia 21, o Afonso, teve consulta com a médica fisiatra e a equipa multi-disciplinar que o acompanha.
Antes da consulta, tivemos terapia da fala que correu muito bem, o Afonso foi para a piscina de bolas com a irmã e surpreendentemente, gostou!
A consulta focou-se na evolução do Afonsinho:
  • Melhoria da postura e controlo da cabeça
  • Braços e mãos estão bem (em termos de movimento e mobilidade)
  • Pernas tensas e com o tendão mais preso (chamada de atenção para esta situação)
  • Bom controle de cabeça na posição ventral
  • Proporcional (perímetro cefálico, peso e cumprimento)
  • Grande choro quando sentado na cadeira (opinião: situação comportamental - birra)

Avaliação positiva, a médica acha que o Afonso está bem.

Fiquei preocupada em relação às pernas mas, foi a primeira consulta que se preocuparam em avaliar a evolução do Afonso, porque o que ele não consegue fazer e as suas limitações já nós sabemos. Foi uma consulta virada para o optimismo, moderado e sem euforia, a valorizar o trabalho dos terapeutas e o meu. Ficam as palavras da fisiatra:

Atenção, não deixem de ter em conta A FORÇA DE VONTADE, desta criança!

Deficiência

A deficiência, é um tema, que não faz parte do dia a dia das pessoas comuns. Todos sabemos que existe mas, verdadeiramente, passa-nos ao lado, assim como passam a sida, as doenças oncológicas e tantos, tantos outros temas.
Compreendo, quando as pessoas se sentem tristes, perante a nossa situação e a situação do Afonso.
Já não compreendo e também não aceito, a dificuldade, que os profissionais de saúde (médicos, terapeutas, enfermeiros, entre outros) demonstram em utilizar a palavra deficiência. Gostam de utilizar quando se referem à diferença que os outros são "ditos normais". Claro que a "dita normalidade" tem que se diga. O que é ser normal? Mas vivemos em sociedade, e em sociedade a norma, a normalidade é ditada pelos padrões em maioria.
Assim, se a palavra deficiência, não é, a mais indicada temos que usar outras: dificuldades, necessidades especiais, ou outra que se enquadre neste padrão menor.
Mas temos que aceitar! Porque enquanto a sociedade, não aceitar, que existem pessoas diferentes, com dificuldades e necessidades especiais, continuaremos num país em que mais tarde se revolve, um país onde logo se vê. Será que os nossos governantes não entendem que o NÃO investimento na intervenção precoce, em dotar estas crianças de maior autonomia, será uma factura pesada no nosso futuro, no futuro delas?
Temos que dar o primeiro passo, ACEITAR, e rapidamente INTERVIR!

Super irmão


O G. é um miúdo fantástico, querido, sensível.
Adora o irmão, tem 13 anos.
Posso deixar o Afonso sozinho com ele. Adormece-o, prepara e dá-lhe o biberão, muda-lhe a fralda.

Palavras para quê?
É um SUPER IRMÃO.

Super PAI


Podia ir consultar o dicionário, à procura de todos os adjectivos para qualificar o pai, mesmo assim não lhe ia fazer justiça.
O F. é um pai fantástico, já à 13 anos que o prova mas, com o Afonsinho excede-se. Não tenho palavras para descrever.

O Afonso tem 17 meses, durante este tempo deve ter dormido a noite inteira, de forma intermitente, durante 15 dias.

TODAS AS NOITES, SIM, TODAS AS NOITES é o pai que se levanta para lhe dar o biberão, mudar a fralda e voltar a adormecê-lo.

Palavras para quê?
É verdadeiramente um SUPER PAI...

Alimentação

Horrível, terrível, desesperante...
Alimentar o Afonso, foi, desde o primeiro dia, o nosso maior pesadelo.
Quando chegava a hora de comer eu, olhava para o pai, o pai olhava para mim e ficávamos os dois muito quietinhos, sem respirar, sem nos mexer, a ver quem ia dessa vez.
Vou abreviar, porque não quero esquecer os momentos menos bons mas, quero seguir em frente.
O Afonso não mamava o biberão e a partir dos três meses e meio começou a comer com colher.
A alimentação era feita com o Afonso, meio sentado em duas almofadas encostadas à mesa e de frente para mim. O Afonso chorava, gritava, cuspia, fazia a patologia (hiper-extensão) durante toda a refeição, que durava cerca de 45 minutos.
Nas férias de Verão, no dia 27 de Julho o Afonso, pela primeira vez, comeu a sopa toda sem chorar e assim se tem mantido até hoje.
O Afonso come tudo, menos produtos lácteos, esmagado com garfo ou mini-sólidos. Aceita, normalmente bem, a alimentação mas, continua a comer só comigo, se for outra pessoa a dar-lhe de comer, a alimentação torna-se difícil. Come sentado no meu colo e ainda faz hiper-extensão.

Hiper-sensibilidade

O Afonso sofre de hiper-sensibilidade, os livros descrevem, que cada vez que lhe tocamos é como se sofresse uma queimadura.
Tem hiper-sensibilidade na face, intra-oral (dentro da boca) o que torna MUITO DIFICIL a alimentação e nas mãos o que lhe dificulta conseguir a linha média (juntar as mãos), colocá-las na boca, agarrar e tocar nos brinquedos.
O Afonso é um bebé com indicação para ter sonda, e mais tarde, ser alimentado através de ligação directa ao estômago.
O pai, durante sete meses, foi o único que conseguia dar-lhe biberão e por isso aos três meses e meio comecei a dar-lhe papa, com colher.
O Afonso é um bebé corajoso, lutador e eu nunca desisti.

Uma nova etapa

Eram enormes as expectativas. O Afonso passou a ser acompanhado no Centro de Paralisia Cerebral no inicio de Outubro. Foi avaliado por uma equipa multidisciplinar composta por fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, terapeuta da fala e assistente social.
Logo na primeira semana ficou definido, que o Afonso seria acompanhado por uma fisioterapeuta sénior, a coordenadora, e não teria terapia ocupacional.
Durante 4 meses o Afonso foi acompanhado pela Z.. Fisioterapeuta fantástica, que desde logo conquistou o Afonso. Foi uma boa companheira de conversa, explicando-me e ensinando as posturas, a forma de continuar a trabalhar com o Afonso em casa. Mas, o fim desta parceria já estava planeado, a terapeuta ia ser operada e a partir de Janeiro/Fevereiro deixaria de poder estar com o Afonso.
Esperava que no Centro o Afonso pudesse fazer mais sessões de fisioterapia. O que nunca foi possível, assim, a partir de Novembro o Afonso passou também a ser acompanhado, primeiro, numa clínica privada e a partir de Fevereiro em casa, por forma a puder trabalhar todos os dias.

A nossa enfermeira preferida


Desde o inicio, felizmente, contámos com bons amigos.

A nossa enfermeira preferida, a minha prima A. esteve à frente na disponibilidade, na ajuda, nos ensinamentos.

Não há, não tenho palavras, para te dizer tudo o que fizeste e continuas a fazer pelo Afonsinho, por mim e por todos nós.


AMIGA de todas as horas, especialmente das difíceis, OBRIGADA por nos deixares fazer parte da tua vida...

Iniciativa própria

Como já escrevi, encontrei pelo caminho, maus técnicos de saúde. Técnicos que acham que estão acima dos colegas, que são melhores profissionais, que tiveram atitudes menos próprias, com pouca moral e muito pouco civismo.
Uma das perguntas que me fazem é quem enviou o Afonso, como aqui chegou?
Por INICIATIVA PRÓPRIA.
  • Conseguimos que o Afonso fosse aceite no Centro de Paralisia Cerebral
  • Conseguimos a natação adaptada
  • Fizemos fisioterapia em clínicas privada e em casa de forma privada
  • Aprendi a utilizar a musica como terapia
  • Aprendi Shantala (massagem de relaxamento para o bebé)
  • Faz acupunctura
  • Faz fitoterapia
  • Contactámos a Equipa de intervenção precoce da Amadora (educadoras do Ensino Especial)
  • Contactámos e mudámo-nos para a Fundação Liga
  • Solicitámos e conseguimos fazer mais sessões de terapia
  • Solicitámos e começou a fazer Hidroterapia
  • Começou a fazer Hipoterapia
Foi difícil, é difícil...
É caro, muito caro...
Mas é possível, temos que lutar e lutar!

A arte de ser feliz

Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como reflectidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Às vezes um galo canta. Às vezes um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.
Cecília Meireles

Intervenção precoce

Pesquisei muito, li muito, fiz muitas perguntas e rapidamente percebi, que era possivel contrariar o diagnóstico. Como? Através da intervenção precoce.
Estimular, estimular, estimular... a palavra mágica
Deixei de trabalhar e passei a dedicar todo o meu tempo à recuperação do Afonso.
O Afonso começou, ainda no hospital, a fazer fisioterapia e terapia da fala. Este acompanhamento continuou em casa com o apoio dos Franscisquinhos (instituição que apoia os bebés do S. Francisco Xavier), duas vezes por semana até ao fim de Setembro de 2007.
O Afonso desde cedo percebeu o que era trabalho e o que era divertimento.
Manteve, desde o inicio até ao fim, um relacionamento dificil com a terapeuta. Foi uma pessoa muito importante na vida dos Afonso, da nossa familia e na minha. Ensinou-nos muito, ouviu-me muito, foi uma grande amiga.
Aos 4 meses e meio, conseguimos que o Afonso fizesse um teste, na Cidade Universitária, para fazer natação adaptada. Foi aprovado e no dia 22 de Junho (6 meses e 1 dia), dia do nosso casamento, começou a fazer natação.
Em Junho, iniciámos o processo para a admissão do Afonso no Centro de Reabilitação de Paralisia Cerebral Calouste Gulbenkian, onde começou a ser acompanhado a partir de 1 de Outubro de 2007.
Com 6 meses o Afonso fazia fisioterapia, terapia da fala, natação, massagens e musicoterapia e era acompanhado 24 horas por dia pela familia.

Será que valeu a pena

Desesperada, deprimida, angustiada, triste, revoltada, perdida e com uma enorme pena de mim mesma, era assim que me sentia no inicio de 2007 e me senti durante muitos meses.
Quando o Dr. L.P. me perguntou: "Será que valeu a pena?" eu não lhe respondi, não podia fazê-lo sem dizer o que sentia:
Valeu a pena para o Afonso?
Valeu a pena para os irmãos?
Valeu a pena para nós?
O meu pensamento era um: O Afonso ia ficar totalmente incapacitado, ia valer a pena para quem?
O diagnóstico era tão grave que eu pensava que ao fim de um mês o Afonso já estaria paralisado, que nunca iria conseguir comer...
Mas, a vida é irónica, ao mesmo tempo que sentia todo este turbilhão de emoções, nunca deixei de lutar pelo Afonso. Não me perguntem como, porque eu não sei responder.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Finalmente... em casa

Após longos, longuissimos 32 dias, trouxemos o Afonsinho para casa.
A primeira semana em casa foi terrível, avassaladora, muito sofrida. Questionámo-nos, questionei-me, vezes sem conta, se tinha feito bem em trazê-lo para casa.
Chorava dia e noite, não chorava, gritava. O leite descia pela sonda até ao estômago mas, a força de chorar era tanta, que voltava a subir para a seringa. Estávamos desesperados.
Na terça-feira arrancou a sonda, não queria o biberão, chorava desesperadamente com fome. Entrei em pânico, liguei para o meu marido e pedi-lhe que viesse para casa (estava em Lisboa). Caí em mim e pensei eu sou capaz, tenho que ser capaz e assim foi, pela primeira vez entubei o Afonso e a partir desse momento, entubei as vezes que foram necessárias, muitas, porque ele estava sempre a arrancar a sonda.
Na quarta-feira recebemos as terapeutas que iam acompanhar o Afonso. A terapeuta da fala e a fisioterapeuta, que nos animaram um pouco, dizendo-nos que eram sinais muitos positivos o facto do Afonso se monstrar desconfortável, demonstrava que percebia que estava noutro ambiente: mais calmo, menos quente, mais silencioso.
Na sexta-feira, fomos ter ao hospital com o Pediatra. Os médicos felicitavam-no por ele ter conseguido salvar o Afonso, diziam, que se não tivesse sido ele, tal não teria sido possível. O Dr. L.P. perguntou-me: - "Será que valeu a pena?"
Não lhe respondi, até hoje ainda não lhe respondi mas, hoje, já sei a resposta: Claro que valeu a pena.
Nesse dia, fez-no o pior cenário possivel mas, nós já sabiamos, a grande, a enorme diferença está na maneira de o dizer. Acredito que o Dr. L.P. é um ser humano fantástico, por isso, penso que pode dizer tudo, que os pais vão compreender e ficar agradecidos por poderem contar com ele.
Nessa noite voltamos para casa com um novo leite na bagagem, chegámos a casa da nossa enfermeira favorita e preparámos um biberão. Ela juntou-lhe uma colher de papa e aconteceu o milagre, o Afonso mamou o biberão todo e a partir desse dia, com muitas dificuldades e com muita perserverança, o Afonso nunca mais foi entubado.

A história dos Amiguinhos

Meu querido mano Afonso, vou contar-te a história dos teus amiguinhos.

Os teus amiguinhos, aqueles que moram no teu cérebro, foram fazer uma corrida, com uns carrinhos a pilhas (iguais aquele do Nodi que tu tanto gostas) e tiveram um acidente. Infelizmente foi uma tragédia e alguns dos teus amiguinhos morreram.
Os teus outros amiguinhos, tomaram o lugar deles e agora trabalham muito, pois trabalham a dobrar e é por isso que tens algumas dificuldades.
Como és muito lutador e corajoso, qualquer dia, já não se nota, que as tuas mãos são preguiçosa ou que a tua cabeça, ainda cai, por vezes, e marcas golos à Cristiano Ronaldo. Bem, tenho que te dizer, que na verdade as tuas mãos não são preguiçosas, nem tu, apenas fazes as coisas mais lentamente mas, afinal os teus amiguinhos andam sempre a correr, para chegar a todo o lado.
Eu acho que os teus amiguinhos vão fazer um bom trabalho, mais lento é certo, e tu vais andar, falar e aprender muitas coisas. Mas também te digo, se não conseguires fazer alguma destas coisas, eu cá estarei para te ajudar e garanto-te: VAIS SER MUITO FELIZ


P.S. Se por acaso tiveres que andar numa cadeira de rodas, não tem preocupes, que eu cá estarei para a empurrar e fazer grandes corridas contigo.


Não te esqueças que és o rei dos nenucos.



Beijinhos da mana C.

Talvez

Talvez não ser,
é ser, sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão que,
talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém
soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento,
E desde então, sou porque tu és
E desde então és,
sou e somos...
E por amor
Serei... Serás...Seremos...

Pablo Neruda

Amar como Jesus amou

Um dia uma criança me parou
Olhou-me nos meus olhos a sorrir
Caneta e papel na sua mão
Tarefa escolar para cumprir
E perguntou no meio de um sorriso
O que é preciso para ser feliz?

Amar como Jesus amou
Sonhar como Jesus sonhou
Pensar como Jesus pensou
Viver como Jesus viveu
Sentir o que Jesus sentia
Sorrir como Jesus sorria
E ao chegar ao fim do dia
Eu sei que dormiria muito mais feliz

Padre Zézinho

Um

Amigo é uma pessoa com a qual se pode pensar em voz alta.

Ralph Waldo Emerson, pensador norte-americano

Ser amigo

Alguns pensam que para se ser amigo basta querê-lo,
como se, para se estar são, bastasse desejar a saúde...

Aristóteles

Amizade

Nenhum caminho é longo demais quando um amigo nos acompanha.

Autor desconhecido

A verdade é bem maior

O que eu sei é que além do horizonte existe uma luz
Que brilha sempre, sempre, aleluia, amém
O que eu sei é que quando escurece aqui dentro de mim
Para além do horizonte existe uma luz que não tem fim

Padre Zézinho

terça-feira, 27 de maio de 2008

Meu querido e adorado filho

Afonso
O teu nascimento foi difícil, as nossas almas abandonaram-nos, a minha e a tua mas, o amor que nos une não nos deixou partir e voltámos a encontrar-nos.
Juntos percorremos, dia a dia, este caminho. Um caminho repleto de amor, carinho e esperança.
O amor da tua família unida, acredita, desde o primeiro momento, que tu meu filho és uma dádiva, e tens nesta vida, um papel muito importante a desempenhar. Independentemente do que vai ser a tua vida, SABEMOS, que irás ser uma criança alegre, feliz e muito amada.
Confiamos em Deus e sabemos que vais ter um futuro sorridente, coberto de sol e de luz e que o sonho vai ser o teu limite...
9 Maio de 2007

Pegadas na areia

Os caminhos de nosso Senhor
Só quem ama percorreu
Só quem sonha conheceu
São caminhos cheios de amor
Que nem sempre o sonhador
É capaz de entender
Alguém me disse que sonhou
Que estava numa praia caminhando com Jesus
E olhando o céu viu sua vida Tanta estrada percorrida
Sempre em busca de uma luz
E olhando as marcas na areia
Viu ao lado dos seus passos as pegadas de Jesus

E aí ele falou: - Não te entendo, meu Senhor!
E olhou pro chão - Nos caminhos mais difíceis, eu não vejo as tuas marcas
Por que me deixaste só?

Jesus respondeu: - Os passos são só meus, jamais te abandonei
É que nos momentos mais difíceis de viver
Nos meus braços te levei

Padre Zézinho

Anjo da Luz


Na enfermaria partilhamos o quarto com mais três bebés. O Afonsinho é o caso mais grave mas, todos estão ali porque têm dificuldades alimentares e estão entubados com sonda.

A G. mãe dos meninos gémeos, costuma ficar, como nós, até à meia-noite.
Numa noite estávamos as duas sozinhas, todos os bebés dormiam e ela começou a falar comigo.

A voz calma e doce, falava como se estivesse envolta num manto de luz que me transmitia paz.. e falou-me de Jesus Cristo, de como ele protegia quem amava. Falou-me que o Afonso tinha escolhido este caminho, difícil, cheio de pedras e espinhos mas, que um anjo poderoso o protegia e o acompanhava e que ele era um menino da luz, e que não me revoltasse, porque os médicos estavam enganados. O caminho do Afonso estava realmente traçado mas era um caminho de luz...

Estas palavras entraram no meu coração, tocaram a minha alma, que andava perdida e trouxeram-na de volta.
Mais tarde pensei que a senhora era fanática de alguma religião e que a partir daquela noite teria que a ouvir, mas não, ficámos várias noite sozinhas e tal assunto nunca mais foi falado.

Acredito... o meu Anjo da Luz tem um caminho a caminhar e eu caminharei todos os dias com ele...

O rótulo

No dia que o Afonso foi para a enfermaria, duas médicas a Drª G. e a Drª F. (interna) fizeram um exame ao Afonso. Quando a Drª G. pegou nas mãos do Afonso e o levantou a cabeça ficou toda para trás, caída. Ora muito bem, o diagnóstico estava feito, abanou a cabeça, pôs o rótulo e a partir desse dia nunca mais viu o Afonso, sendo acompanhado pela Drª F.
O Afonso continuava internado porque não conseguia mamar e continuava entubado com sonda.
Um dia, imaginem, a Drª G. apareceu porque o Afonso chorava muito de noite. É então que entra em cena o neurologista, Dr. J. C. (que ainda hoje acompanha o Afonso). A senhora Drª queria OBRIGAR o neurologista a SEDAR o Afonso. O bebé estava irritado (como fiquei a odiar esta palavra), chorava muito, blá, blá, blá, até que eu lhe disse que quem já estava a ficar irritada era eu...
Naquela tarde chorei, chorei, chorei... Acho que chorei tudo o que tinha para chorar e disse aos médicos e enfermeiros que ninguém dava NENHUM medicamento ao meu filho sem a minha autorização.
Nessa tarde percebi de forma violenta, que a vida deste menino estava rotulada mas, a partir deste dia passámos a ficar 24 horas com o Afonso, e percebemos com tristeza, como funciona a enfermaria de pediatria de um hospital, aprendemos a entubar o Afonso, e não nos calámos até que dia 22 de Janeiro, 32 longos dias após o nascimento do Afonsinho o trouxemos para casa ainda entubado...

Falta de amor...

É verdade, como podem ser aquelas pessoas enfermeiras e médicos? Onde está a compaixão? A solidariedade? A compreensão?
Tudo começou nos cuidados intermédios. As enfermeiras pouco se preocupavam com o Afonso. Para ser correcta apenas duas a G. e a S. o tratavam bem.
Comecei a perceber como ia ser a vida deste menino. O rótulo estava lá "deficiente". Nasceu assim e segundo o padrão a sua vida e o seu destino estavam traçados.
Desde cedo começou a minha revolta e não deixei, não deixo e nunca deixarei que tratem o Afonso de maneira diferente e sem amor...

O Olhar

Não sei como descrever a sensação de olhar para o Afonso.
Dentro da incubadora, todo ligado, e meu Deus, o olhar, aquele olhar... um olhar vazio, como se não tivesse alma (se calhar acompanhou a minha naquele dia 21).
Duro, muito duro!
Os médicos, seres humanos fantásticos, traziam más noticias. O Afonso tinha sofrido uma asfixia muito grave durante o parto e se conseguisse sobreviver, o que era pouco provável, iria ficar TOTALMENTE incapacitado.
A dor era feroz e violenta e não me abandonava nem de noite nem de dia.

Enfermaria de Pediatria

Com 15 dias o Afonso foi transferido para a Enfermaria. Aqui a liberdade é total e tratamos do Afonso como se estivéssemos em casa. A Equipa de enfermagem é boa, ao contrário da dos cuidados intermédios e mostram-se preocupados e colaborantes com a maior dificuldade do Afonso. A alimentação. O Afonso continua entubado com sonda para ser alimentado e alguns enfermeiros esforçam-se por dar biberão ao Afonso.
Após a minha insistência o Afonso começou a fazer fisioterapia e terapia da fala.

Cuidados intermédios

No dia 27 de Dezembro o Afonsinho foi transferido para a unidade de cuidados intermédios.
Estamos no hospital de manhã à noite, damos-lhes banho, damos o leite na sonda e no biberão, damos os medicamentos, mudamos as fraldas, controlamos os aparelhos. Tratamos dele de forma autónoma.
Agora só o queremos levar para casa.

Cuidados intensivos II

Hoje, dia 26 de Dezembro, deixaram-me pegar o Afonso ao colo, já não está ventilado, respira sozinho e as agulhas e aparelhos estão a diminuir.

É tão lindo, gorducho, cabelo loirinho a querer fazer caracóis.

A vida, o inicio de vida, está a ser duro mas, a partir de hoje o colo chegou, a vida do meu pequeninho está finalmente nas minhas mãos...

Abanar... mas não cair

Hoje, dia de Natal, acabei de conhecer o meu filho Afonso.
Passaram 5 minutos, quando uma médica, Drª M. se aproxima de nós. O meu marido apresenta-me: " É a mãe, teve alta hoje, acabou de conhecer o bebé".
Ela, olha para nós, diz-nos que fizeram outra eco à cabeça do Afonso, olha para mim, toca-me no braço, abana a cabeça e diz "lamento".
O mundo desaba, não aguento, é demais, saio rapidamente da sala e choro, como choro agora que estou a escrever e já passaram 17 meses. Hoje como naquele dia pergunto-me. É necessário tratar assim os pais? Que espécie de seres humanos são estes, os médicos?
Hoje como naquele dia, abano mas não caio e enquanto tiver forças não hei-de cair...

O meu Natal

Sem alma, pois esta, abandonou-me no dia do nascimento do Afonso, os dias sucederam apenas porque o sol, que não é preguiçoso, insistia em levantar-se, e a lua, brincalhona, não perdia por nada as brincadeira com as amigas estrelas.
O Natal foi passado numa cama, com lençois brancos e frios, numa enfermaria branca e fria, sozinha numa noite branca e fria.

Os outros...

Aqueles que me viraram as costas, que não me apoiaram, que afinal não eram amigos.. para esses apenas uma palavra: PERDÃO.
Estão perdoados, a vida é feita de momentos e eu, só quero na minha vida, os momentos bonitos, alegres, coloridos, doces e felizes...
Ponto final parágrafo.

Amar

Como pode ser difícil amar, quem já se amava?
Quando o Afonso nasceu, o que ouvi em vez do choro, foi a aflição do médico que desesperadamente tentava reanimá-lo e trazê-lo de volta.
Naquele momento, a minha alma abandonou-me, deixando ali o meu corpo mal tratado e inerte e assim ficou durante muito tempo. Tempo de mais...

Plano perfeito

Parto planeado...
- Tinha que ser antes do Natal para que o G. e C. não sentissem de forma negativa o nascimento do irmão.
- Tinha que ser nas férias escolares para poder apoiar o G. e a C.
- Tinha que ser antes do fim do ano, para não perder um ano na escola
Tinha, tinha, tinha...

Afinal o que falhou no meu plano perfeito?
A ironia da vida!

Afinal o que controlamos nós? Nada...

É Natal

Finalmente, VOU CONHECER O AFONSO...
O Natal chegou, finalmente posso ir conhecer o meu filho...

Cuidados intensivos

Cerca de 5 horas após o nascimento e depois de estar estabilizado o Afonsinho foi transferido do Hospital de Cascais para o S. Francisco Xavier.
Durante 6 dias ficou internado nos cuidados intensivos. Numa incubadora, ventilado (não respirava sozinho), sedado, alimentado com soro, ligado a todo o tipo de máquinas...

O que é paralisia cerebral?

"A criança com Paralisia Cerebral tem uma perturbação do controlo da postura e movimento, como consequência de uma lesão cerebral que atinge o cérebro em período de desenvolvimento.
(...)A criança com Paralisia Cerebral pode ter inteligência normal ou até acima do normal."

Retirado de "A criança com paralisia cerebral" - Guia para os pais e profissionais da saúde e educação APPC
Hoje caminho, o céu está azul, o sol brilha esplendoroso, oiço o chilrear dos passarinhos e o silêncio...
O silêncio no meu coração,
Os momentos, os meus momentos felizes...
Oiço o riso das crianças, cheiro a maresia que vem do mar, caminho descalça pela areia, continuo a sonhar.
Sonho, que o teu limite é o sonho e que o teu caminho, tem tantos obstáculos, uns já vencidos e outros, tantos outros, por vencer...
Dificil, é este nosso caminho mas, sei que embora seja feito devagar, muito devagar, sei que chegaremos ao destino deste nosso caminho que se faz caminhando...

Dina

Sou uma caminhante na estrada do aprendizado do amor. Às vezes, exausta, eu paro um pouquinho. Cuido das dores. Retomo o fôlego. Depois, levanto e seduzida, enternecida pelo chamado, cheia de fé, eu prossigo. Um passo e mais outro e mais outro e mais outro, incontáveis. Sei de cor que não é fácil, mas sei também que é maravilhoso olhar para o caminho percorrido e perceber o quanto a gente já avançou, no nosso ritmo, do nossos jeito, um passo de cada vez.

Ana Jácomo
E Deus continua susurrando: Não desista, o melhor ainda está por vir...
Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver.

Dalai Lama

O amor é um caminho que clareia, progressivamente, à medida em que o percorremos, como se cada passo nosso fizesse descortinar um pouco mais a sua luz.
A jornada é feita de dádivas e alegrias, mas também de imprevistos, embaraços, inabilidades, lições de toda espécie.
De vez em quando, tropeçamos nos trechos mais acidentados. Depois, levantamos e prosseguimos: o chamado do amor é irrecusável para a alma. Desistir dele, para ela, é como desistir de respirar.


Ana Jácomo
Quando eu deixei de olhar tão ansiosamente para o que me faltava e passei a olhar com gentileza para o que eu tinha, descobri que, de verdade, há muito mais a agradecer do que a pedir. Tanto, que às vezes, quando lembro, eu me comovo. Pelo que há, mas também por conseguir ver.

Ana Jácomo
Nem sempre querer é poder, porque às vezes a gente quer, mas ainda não pode. Ainda não consegue realizar.
Não faz mal: a vontade que é legítima, alinhada com a alma, caminha conosco, paciente, fresca, bondosa, até que a gente possa. Às vezes, isso parece muito longe, mas é só o tempo do cultivo. As flores, como algumas vontades, também desabrocham somente quando conseguem


Ana Jácomo
Depois de cada momento de fraqueza, meu coração prepara, em silêncio, uma nova fornada de coragem.
Às vezes cansa, sim, mas combinamos não desistir da força que verdadeiramente nos move.

Ana Jácomo

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